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quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

Memórias de um tornado

Uma semana após a passagem do tornado pela vila de Ferreira do Zêzere, ainda se sentem os efeitos que o fenómeno causou na vida dos ferreirenses. São claros os danos causados pelo tornado que devastou 229 habitações da Freguesia, cerca de 250 automóveis, florestas, infra-estruturas municipais, estabelecimentos comerciais, entre outros.


Como tudo começou…

   Eram cerca das 14h30 quando um barulho ensurdecedor invadiu casas e espaços ferreirenses. O vento soprava a mais de 150 km por hora e atrás de si deixava um rasto de destruição nunca antes visto em Ferreira do Zêzere. O tornado arrancou telhados de casas, derrubou árvores, destruiu automóveis e deixou a população em verdadeiro pânico. “Estava em casa quando ouvi muito barulho e fui à janela. Quando espreitei, o tornado passava, talvez, a cerca de 500 metros da minha casa. Só via telhas e bocados de árvores a voar. Foi inacreditável!” afirma Celestino Gaspar, um habitante ferreirense. Acrescenta, ainda, que “a floresta em frente ficou completamente devastada. Foi uma sorte não atingir a minha casa”.

Vários feridos não registados

   Mª Amélia Duarte, vendedora, ia em direcção a sua casa, com o seu marido, quando começou a cair granizo. A vendedora pensou que fosse trovoada. Segundos depois, vê uma nuvem muito escura e “ramos de árvores a saírem disparados”. Pede, então, ao seu marido que pare o carro. “De repente, vem um estrondo, o vento pega na carrinha que dá umas quantas voltas no ar ” afirma Amélia. Nesse momento, sentiu que ia morrer e pensou que “nunca mais fosse ver os filhos”. Mª Amélia Duarte confessa que nunca tinha sentido tanto medo na sua vida. Apesar da gravidade do incidente, a vendedora não sofreu nenhuma fractura. Teve, apenas, hematomas pelo corpo e tem, ainda, dores quando tosse. Foi assistida no Centro de Saúde de Ferreira do Zêzere e no Hospital de Tomar. “Quando entrei no hospital só ouvia pessoas a gritar que tinham ficado sem casa” lembra.
   No concelho ferreirense, várias pessoas ficaram feridas apesar de apenas sete pessoas terem sido registadas. Os sete feridos foram, primeiramente, assistidos no Centro de Saúde de Ferreira do Zêzere e só mais tarde foram transportados para o Hospital de Tomar. Na Freguesia de Ferreira do Zêzere não há registo de nenhum ferido grave, como afirma Pedro Alberto, Presidente da Junta de Ferreira do Zêzere.

Os prejuízos que ficam

   Luís Graça, funcionário das Piscinas Municipais de Ferreira do Zêzere, encontrava-se, com um aluno, num dos cantos da Piscina Municipal quando o tornado se aproximou. “Primeiro faltou a luz e havia trovoada. Associei o que estava a acontecer porque tinha recebido uma mensagem da minha namorada a contar o que se tinha passado em Tomar. Por isso, foi mais fácil ter chegado à conclusão e ter dado o alerta para fugirmos. Se não fosse isso, se calhar tinha ficado ali a olhar até que sentisse que corria perigo” afirma Luís. O responsável pelo Sector de Desporto da Câmara Municipal de Ferreira do Zêzere (CMFZ), adianta, ainda, que se o tornado tivesse ocorrido mais cedo ou 50 minutos mais tarde, estariam várias pessoas na piscina e “aí a tragédia teria sido bem maior”.
   Os prejuízos ainda não estão definitivamente calculados mas Jacinto Lopes, presidente da CMFZ, admite que “pelo menos 2,5 milhões de euros” estão garantidos. Pedro Alberto, presidente da Junta de Ferreira do Zêzere, esclarece que desses 2,5 milhões de euros, meio milhão pertence aos prejuízos nos edifícios municipais.
   Os edifícios municipais mais afectados foram o Centro Cultural, Cineteatro Ivone Silva, Piscinas Municipais e o Terminal Rodoviário.
   Nas Piscinas Municipais, parte do telhado ruiu, quase todos os vidros partiram, os painéis solares desapareceram ou ficaram danificados.
   Do outro lado da estrada, encontra-se o Centro Cultural que ficou, também, bastante destruído.
   Isabel Silva, funcionária da CMFZ, encontrava-se dentro do Centro Cultural no momento. “Havia vento e fui às janelas das traseiras. Vi as acácias a tombarem e comecei a gritar pela minha colega que estava no rés-do-chão. Entretanto, o vento entrou no edifício e começou a partir os vidros todos” conta. Depois de se juntar à colega, o vento fechou a porta do corredor. “Estávamos trancadas e havia muito fumo, soubemos agora que tinham sido os extintores. Estávamos em pânico porque não conseguíamos fugir. Eu comecei a pontapear a porta até conseguirmos sair” conta Isabel. A funcionária acrescenta “foi uma sensação horrível! Nem sequer me passou pela cabeça que tivesse sido um tornado. No momento, não pensei em nada, só pensei que ia morrer lá de baixo”.
   No cineteatro, o telhado e o tecto ficaram “completamente destruídos. O tecto ficou com uma “clarabóia”, um buraco como se tivesse entrado uma bola gigante no meio do teatro” acrescenta o presidente da Junta de Freguesia.
   Já os proprietários de estabelecimentos comerciais não têm, ainda, a certeza do valor dos prejuízos mas já calculam a sua dimensão. Cristina Branco, proprietária de uma loja de equipamentos de ar condicionados e aquecimentos, afirma que o seu prejuízo rondará os 50 mil euros. Na sua loja, grande parte do prejuízo foi no desaparecimento ou nos danos dos painéis fotovoltaicos, nas três chaminés que ruíram e nos dois portões que foram arrancados.
   Maria de Lurdes Rosa, proprietária do restaurante “A Grelha”, diz que ainda não têm os prejuízos calculados. Os proprietários do restaurante viram a parte recente do seu restaurante, inaugurada em Julho, ficar com “um buraco”, que já foi restaurado. “Os maiores prejuízos foram as suas duas carrinhas, que ficaram destruídas, os vidros partidos e a uma casa nossa ao lado do restaurante, que ficou sem telhado” explica.

Projectos de apoio

   O Fundo Municipal não foi, ainda, activado. Pedro Alberto confessa só acreditar no apoio do governo “depois de ver”. Acrescenta, também, que apesar de conhecer casos em que a população espera dois ou três anos para receber apoio, acredita que, “se chegar a vir alguma coisa”, será mais rápido pois “são 309 famílias que estão envolvidas (229 na Freguesia ferreirense) ”. No entanto, crê que os apoios serão mais dirigidos às Pequenas e Médias Empresas do que às habitações. “Temos situações de famílias em que os dois têm cerca de 440 euros de reforma e ficaram sem nada. Está-se a fazer esse levantamento com a técnica social da Câmara e fará chegar a situação à segurança social, que irá ter um papel importante neste campo.”
   O presidente confessa que tanto a Junta de Freguesia, como o Município, iram ter grandes dificuldades em ajudar essas famílias. “Vai ter que haver alguma ajuda em pequenos materiais para uma ou outra família em pior situação.” Segundo as palavras de Pedro Alberto, “houve empresas que ofereceram materiais. Vamos aguardar para ver o levantamento da Segurança Social e quando terminar, o apoio chegará ao sítio certo”.
   Quanto ao casal desalojado, noticiado pelos meios de comunicação social, “continua instalado nos edifícios sociais da Câmara Municipal” profere o Presidente da Junta de Freguesia ferreirense.

Apoios voluntários

   Durante o fim-de-semana, escuteiros da Região de Lisboa e Coimbra, em conjunto com Agrupamento de Escuteiros de Ferreira do Zêzere, ajudaram a população e a CMFZ na remoção dos destroços. No entanto, esta não é a única ajuda voluntária organizada.
   O município de Ferreira do Zêzere, coligado com as Juntas de Freguesia de Ferreira do Zêzere e de Igreja Nova do Sobral, criou uma conta bancária, apelidada de “Conta Solidariedade”. Esta iniciativa tem como objectivo apoiar as vítimas do tornado que abalou o concelho ferreirense.
   Para além da Conta Solidariedade, a Câmara Municipal está, também, a organizar um concerto de solidariedade. Este projecto tem data prevista para o dia 15 de Janeiro de 2011 e, de acordo com Pedro Alberto, conta com a actuação de artistas conhecidos, apesar de ainda não estarem confirmados. Novamente, os fundos angariados serão destinados às famílias mais carenciadas neste momento. O concerto será na “antiga cerâmica”.
   Ainda outro evento de solidariedade está a ser organizado por Paulina Silva, jornalista do jornal “O Templário”. A data desta iniciativa está prevista para o dia 29 de Janeiro de 2011. Neste caso, os fundos revertem para o casal desalojado ou para o Emissor Regional do Zêzere. A estação de rádio ferreirense foi, também, afectada com o tornado. Segundo a jornalista, são pelo menos 5 mil euros de prejuízo para a emissora. Quanto ao local, não está, ainda, confirmado. “ Falta-me ter resposta ao pedido de cedência do salão dos bombeiros e sem isso não posso avançar” esclarece. Neste momento, a jornalista está a contactar os artistas.

“Tudo está bem quando acaba bem”

   Natércia Henriques, funcionária da Secção de Actividades Ocupacionais do Centro de Recuperação Infantil de Ferreira do Zêzere (CRIF), explica a sua reacção quando o tornado atingiu o edifício. “Ouvi bater, parecia, pedra nos vidros e uma colega preveniu-me de que seria um tornado. Eu não acreditei. O barulho começou a ficar mais intenso até que essa colega saiu da sala e disse que era melhor sairmos também. Nós saímos e começamos a proteger os miúdos. Levámo-los para o corredor e nisto, começamos a ouvir os vidros a partir. Eu nem me estava a aperceber muito bem da situação. De repente, vejo a parte da lâmpada de um candeeiro de rua a entrar disparado dentro da nossa sala” relembra. A funcionária confessa que a sorte foi estarem no corredor porque se tivessem ficado na sala, “alguém teria levado com o candeeiro em cima”.
   José Monteiro, habitante de Ferreira do Zêzere, estava a chegar ao carro quando o tornado atingiu o centro da vila. José apercebeu-se de que algo se passava, entrou no carro e baixou-se. O tornado atingiu o seu carro e destruiu todos os vidros. O ferreirense não teve ferimentos e confessa: “A minha sorte foi baixar-me”.
   “No meio de tanta tragédia e destruição, as pessoas têm de erguer a cabeça e recomeçar a sua vida. A vida não pará!”

Mais informações: Conta Solidariedade - www.cm-ferreiradozezere.pt

Outras fontes: Diário de Notícias; SIC; Câmara Municipal de Ferreira do Zêzere; RTP; Jornal de Notícias

Por Sandra Portinha
Grupo 4

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